IN UMBERTO LENZI I DON'T TRUST
Mergulhar na filmografia do Umberto Lazy é uma furada tão grande quanto ter contato com saudosistas da ditadura militar, mas é um trabalho sujo que alguém precisa fazer, para alertar geral a seguir. Caso esse alguém não enlouqueça ou não se mate durante essas sessões cinematográficas pavorosas, é claro.
E, após ver e até mesmo rever (inclusive, tem filme aqui que eu assisti até mais de duas vezes - acredite se quiser - para ter certeza total do que eu realmente achava à respeito) os 10 thrillers cometidos pelo Umberto Lousy, vim aqui dar alguns curtos pitacos sobre a ruindade geral dessas bobagens.
Cotações entre 0 e 5, mas quase nenhum desses desastres merece mais do que 2 - somente o último sexy giallo do diretor, que merece 2.5 e é o melhorzinho de todos os 10 filmes abaixo, e também o último true giallo dele, que também possui momentos acertados, apesar de, entre outros problemas, trazer um final caótico e bagunçado que me lembra muito o final do Savage Lust, slasher derradeiro do outrora sensacional José Ramon Larraz (''Sintomas de Vampiras'') já em fim de carreira.
PARTE I: SEXY GIALLO
1. O Louco Desejo (Orgasmo, 1968) [Cotação: 1.]
Outro notório charlatão, o Sergio Martino, teve sua decadência giallesca iniciada apenas no seu segundo filme do estilo (o débil e nonsense A Cauda do Scum Peão, cujo final é repudiado pelo próprio protagonista George Hilton - bem, poucas coisas são piores do que o Martino querendo dar uma de Hitch...), mas, em O Louco Desejo (cujo final presta uma anti-homenagem a um dos mais belos filmes do Godard), uma trama bem fuckin' boring de bullying com um trio de personagens malas, Lenzi provou que já estreou decadente, seguindo os passos pútridos d'O Doce Corpo de Deborah - filme que chegou muito perto de assassinar o giallo ao popularizar brevemente aquela desgraça chamada sexy giallo, algo que foi pro cinema giallo o que o Bozotário foi pra política brasileira. (Trivia: O título verdadeiramente original disso daqui é Paranoia, mas ele não deve ser confundido com o outro Paranoia do mesmo diretor que vem logo abaixo.)
2. Tão Doce Quanto Perversa (So Sweet... So Perverse, 1969) [Cotação: 1.]
Após estrelar as icônicas bizarrices da giallolândia Eliminação e A Morte Fez um Ovo, Jean Louis Trintignant queimou legal o filme aqui nessa presepada que mais parece novela da Globo falada em italiano e metida a suspense de assassinato - e para piorar tudo de vez, o roteiro é do Ernesto ''O Doce Corpo de Deborah'' Gastaldi, o mais nonsense dos roteiristas nonsense.
3. Os Ambiciosos Insaciáveis (Paranoia, 1970) [Cotação: 1.]
O casal protagonista do desgraçado O Doce Corpo de Deborah (Carroll Baker e Jean Sorel) retorna nesse sexy giallo chato pra caralho (pleonasmo...) cujo único atrativo são as empolgantes cenas ''on the road'' - não a toa, essa porra quase se chamou ''Formula 1'', que seria um título totalmente inusitado para um giallesco. (Trivia: O principal título em inglês disso daqui é A Quiet Place to Kill. Não confundir com An Ideal Place to Kill, o principal título em inglês do filme abaixo. Ô confusão do caralho...)
4. Um Lugar Ideal para Matal (Oasis of Fear, 1971) [Cotação: 2.5.]
O melhor de todos esses thrillers do Lenzi, e muito provavelmente o sexy giallo mais digno já feito (o que não significa muita coisa, mas enfim...): vai extremamente bem (porém num inesperado misto de romance com aventura anárquica de toques sleazy, e não em algo minimamente parecido com giallo) durante os primeiros 21 minutos, até que a personagem da Irene Papas inicia sua interação com o casal de protagonistas (Ray Lovelock e Ornella Muti) e, daí, tudo descamba para as mesmas situações cansativas que podemos esperar de um sexy giallo; o espectador poderá, então, aguardar momentos e sequências similares aos três thrillers anteriores do diretor, com algumas cenas que beiram refilmagens. Triste isso, já que Un Posto Ideale per Uccidere, em mãos competentes, poderia ser uma obra-prima: tinha um potencial gigantesco, além de algumas coisinhas incríveis. Na verdade, por mim o filme nem teria a personagem da Papas e nem teria nada de murder mystery, ficando só naquela vibe romântica-erótica inicial, com os dois contrabandistas de pornografia fugindo da lei e tentando ser felizes. Anyway... O filme marcou a despedida de Lenzi do sexy giallo - subsubgênero felizmente assassinado por Dario Argento através do sucesso d'O Pássaro das Plumas de Cristal, AKA Plumas de Cristal, o filme que acabou de vez com a graça dos filhotes d'O Doce Corpo de Deborah, consagrando ''once and for all'' o true giallo e fazendo com que o sexy giallo seja apenas uma lembrança triste e vergonhosa que tentamos apagar da memória. (PS: A canção-tema How Can You Live Your Life, de I Leoni e Lorenza Visconti, é absolutamente maravilhosa, e infinitamente superior às canções-temas dos outros murder mysteries de Lenzi. Já a escutei incontáveis vezes e não me canso dela. Acho até que a colocaria entre as minhas favoritas de todos os tempos. ''How can you live your life if people won't let you live it the way you'd like?'')
PARTE II: TRUE GIALLO (VERDADEIRO PORÉM NÃO NECESSARIAMENTE BOM...)
5. Sete Orquídeas Manchadas de Sangue (Seven Blood-Stained Orchids, 1972) [Cotação: 2.]
Duas excelentes, atmosféricas e intensas mortes bem no comecinho... São seguidas por uma infinidade de tédio logo após, com a revelação do psycho se mostrando mais ou menos tão péssima quanto a d'A Praia do Pesadelo - pior do que o Lenzi só mesmo o Lenzi. (PS: Orquídeas me faz pensar em outro giallo de 1972: A Morte Caminha à Meia-Noite. Ambos começam de maneira fodástica, fazendo o espectador achar que verá uma obra-prima. Mas, depois disso, ambos viram um porre que beira o insuportável, culminando em finais que são uma vergonha alheia total.)
6. A Lâmina de Aço (Dagger of Ice, 1972) [Cotação: 2.]
Mortes offscreen (menos a do touro, já que isso daqui é do mesmo ano em que Lenzi iniciou o ciclo italiano de canibalismo, desenvolvendo uma tara ''MarianDoriana'' por crueldade animal que também reflete nesse giallo aqui), delírios pretensiosos (a la O Louco Desejo, do tipo ''é isso mesmo ou será que ela está alucinando?'') e plot twists finais bastante problemáticos.
7. Spasmo (Spasmo, 1974) [Cotação: 1.]
Uma masterclass preciosa de como NÃO se fazer um thriller whodunit, com o pateta Lenzi - aliado a enxertos gore na versão americana dirigidos pelo superestimado George ''Zombie King My Ass'' Romero - passando a maior parte do filme tentando desesperadamente nos convencer de que um personagem claramente ''red herring'' é o psycho da trama; até chegar na vexaminosa conclusão reaproveitada de outro giallo do próprio Lenzi. (PS: Teria a cena de abertura, com a descoberta do cadáver pelo casal safadinho, inspirado a intro um tanto similar d'O Mistério no Colégio Brasil? Vai saber.)
8. Gatos Vermelhos em um Labirinto de Vidro (Eyeball, 1975) [Cotação: 2.5.]
QUASE um bom giallo: por um lado tem uma boa atmosfera em momentos variados, além de alguma intensidade nos assassinatos; por outro, tem notórias incoerências no roteiro, problemas técnicos justamente na questão do ''eyeball'' (quando o filme parece não ter muita noção dos seus limites orçamentários-técnicos) e, para foder tudo de vez, tem uma sequência muito ridícula em que um ataque do psycho (que, admito, possui um visual muito interessante, todo de vermelho) é intercalado com um espetáculo de dança - só não é pior do que aquela luta d'A Passageira intercalada com os manés vendo porcaria no drive-in: ou seja, novamente, pior do que o Lenzi é só o Lenzi mesmo. (Curiosidade OFF-TOPIC: Um dos personagens do filme é sósia do Nenê do Malta Bar, assassinado de forma covarde e absurda por um nóia scumbag pouco tempo atrás.)
PARTE III: FAKE SLASHER + MURDER MYSTERY SEM MYSTERY
9. A Praia do Pesadelo (Nightmare Beach, 1989) [Cotação: 1.5.]
Como diabos gostar de um slasher extremamente bagunçado, canastrão e picareta em todos os sentidos, e que ainda comete o maior pecado imaginável em um slasher, que é ter somente mortes sem inspiração - sem contar a revelação final praticamente idêntica a um dos gialli anteriores do próprio Lenzi, e que já não havia funcionado da primeira vez? Fuck. This. Movie. (Sem contar que o Lenzi devia sentir tanta vergonha de ter cometido A Praia do Pesadelo que, de todos os seus 10 thrillers, esse é o ÚNICO que ele tentava ao máximo não comentar, se distanciando ao extremo dessa porra e tentando colocar a culpa da ruindade d'A Praia nos outros. Já os seus outros 9 thrillers ele sempre comentou de boa. A impressão que fica, portanto, é a de que o Lenzi considerava A Praia o pior dos seus 10 thrillers. Um feito e tanto...)
10. A Passageira (Hitcher in the Dark, 1989) [Cotação: 0.]
O fundo do fundo do poço: péssimas atuações (e pensar que o Lenzi também utilizou o psycho daqui em Noite Maldita, PQP...), péssima direção, ultra-ridícula sequência de luta intercalada com uns Zé Ruelas assistindo o igualmente ridículo Grunt (não confundir com a divertida tranqueira Grunt: Confronto Mortal) num drive-in, além de um final odiado pelo próprio Lenzi, que, de acordo com ele, foi uma imposição do produtor Joe D'Amato (só sei que o Lenzi sempre culpava os outros por suas pisadas na bola, nunca assumindo a responsabilidade, como aquilo de culpar o Ernesto Gastaldi por uma série de ruindades mais pro final do Tão Doce Quanto Perversa)... Seja como for, A Passageira só não é o pior giallo da história porque esse título pertence ao debut no giallo do também injustamente celebrado Antonio Margheriti. (P.S. OFF-TOPIC: Ainda pior do que os momentos mais baixos do Margheriti é aquela homenagem ridícula que o queixudo imbecil fez a ele no pavoroso Bastardos Inglórios: um fuckin' hack homenageando outro fuckin' hack, em cena que ainda conta com um fuckin' hack ainda pior, o otário do Eli Roth.)
...
Recapitulando: do menos pior ao pior:
1 Um Lugar Ideal para Matar
2 Gatos Vermelhos em um Labirinto de Vidro
3 Sete Orquídeas Manchadas de Sangue
4 A Lâmina de Aço
5 A Praia do Pesadelo
6 Tão Doce Quanto Perversa
7 Os Ambiciosos Insaciáveis
8 O Louco Desejo
9 Spasmo
10 A Passageira
...
Extra: o cinema do Lenzi é uma desgraça a la atrocidades cometidas por Isralé no mundo moderno ou bandas cover de Skid Row que só tocam música dos dois primeiros discos, mas, com um notável esforço, consegui compilar esse quinteto dos menos piores exemplares dirigidos pelo notório hack charlatão. (É, os meus dias de passar pano para pessoas, diretores, bandas e coisas em geral estão mesmo long gone.)
Meu TOP 5 Lenzi (geral), AKA os menos piores:
À CIDADE UM JUSTICEIRO, A.K.A. A CIDADE E O JUSTICEIRO, A.K.A. O VINGADOR
Poliziesco toscão até a medula (com o protagonista chamado Rambo - já que Lenzi havia acabado de ler o livro que, anos depois, originaria o filme do Stallone, e decidiu usar o nome Rambo), mas possui um certo apelo guilty pleasure e ainda tem uma cena de barra de ferro sendo entortada que é mais ou menos tão ridícula quanto aquela d'Os Canibais do Apocalipse; somente para fanáticos por trashy actioners, portanto. Ahh, e reparem também na cena WTF do ''murder by cocaine'' - por mais que ela não seja nada original, sendo que o já citado A Morte Caminha à Meia-Noite já trazia um trecho praticamente idêntico três anos antes. (PS: Eu provavelmente não deveria pegar tão leve com esse Lenzi, já que isso daqui, na amizade do Rambo com a criança lá, consegue ser mais $pielbergiano do que o próprio $pielberg era na época. Afinal, ''Rambo's Revenge'' é de 1975, época em que o $pielberg ainda não havia virado o câncer do cinema através do Cunts Retardados do Terceiro Reich, de dois anos depois. É tipo o que o Martino fez em um dos piores filmes já cometidos por alguém, Crocodilo: A Fera Assassina, que também consegue ser muito mais $pielbergiano do que o próprio $pielberg - inclusive, eu estava pensando aqui e chegando a conclusão de que Crocodilo: A Fera Assassina, milagrosamente, provavelmente é pior do que QUALQUER filme do $pielberg. É, a ruindade do Martino desconhece limites. E detalhe: ''Croc'' talvez nem seja o pior Martino de todos, já que ele também é o culpado por 2019: After the Flop of New Dork, outro dos filmes mais absurdamente ridículos e deploráveis já realizados. Inclusive, nem sei como não enlouqueci completamente após ter assistido esses duas atrocidades cinematográficas que só um hack terminal como o Martino consegue fazer. Mereço mesmo uma medalha por aguentar ver tanta podridão cinematográfica e manter alguma sanidade.)
CANNIBAL FEROX
Hoje reconheço que Cannibal Holocaust é o ÚNICO filme italiano de canibalismo que realmente presta e que todos os outros, sem exceção, são descartáveis, mas Cannibal Ferox (cujo protagonista Giovanni Lombardo Radice o chamou de um filme ''rascista, fascista e cruel'' - o que, convenhamos, é uma descrição bastante apurada), por mais sensacionalista, mal-feito e mal-intencionado que seja, até tem lá algum charme guilty pleasure também; desde que o espectador seja iniciado em cinema exploitation, claro.
GATOS VERMELHOS EM UM LABIRINTO DE VIDRO
Quase um bom giallo, mas a mão atrapalhada de Lenzi põe tudo a perder.
UM LUGAR IDEAL PARA MATAR
Quase um bom sexy giallo (se bem que ''sexy giallo bom'' é uma lenda urbana, já que não dá para algum filhote d'O Doce Corpo de Deborah prestar - já que nem o original presta), mas a mão atrapalhada de Lenzi põe tudo a perder.
OS VIVOS SERÃO DEVORADOS
Ver Ivan Rassimov fazendo cospobre do Reverendo Jim Jones até trás algum valor guilty pleasure a essa desgraça, e ainda tem a presença da Me Me Lai - que pulou fora da carreira de atriz depois de ter aturado fuckin' assholes insuportáveis e odiadores de animais como Umberto Lenzi, Ruggero Deodato e Lars Von Hitler; aliás, o filme que ela fez com o Trier é uma das coisas mais inacreditavelmente chatas e intragáveis já cometidas desde os tempos do cinema mudo, e parece ter semanas de duração.