sábado, 14 de março de 2020

Trilogia Zé do Caixão na Cinemateca (Breves Observações Gerais)




http://cinemateca.org.br/maratona-da-madrugada-trilogia-do-ze-do-caixao/

Passei a madrugada passada na Cinemateca, onde conferi a Trilogia do Zé do Caixão na tela grande, em sessões gratuitas: À Meia Noite Levarei Sua Alma (1964, 35MM), Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967, HD) e Encarnação do Demônio (2008, 35MM). Venho aqui, portanto, tecer alguns comentários relâmpagos sobre o evento.

O primeiro filme foi exibido ao ar livre, e foi uma experiência e tanto.

Antes disso eu tinha uma péssima lembrança das sessões ao ar livre, graças a uma desastrosa exibição do clássico Deixa Ela Entrar no vão livre do MASP, cerca de dez anos atrás. Foi de dia, com risadas fora de hora e comentários infelizes, que invadiram a sessão e tiraram a concentração de quem tentava assistir ao filme sueco da vampirinha carismática.

Mas À Meia Noite Levarei Sua Alma, na noite passada, foi fenomenal. É o melhor da trilogia para mim, uma grande diversão macabra, com o humor negro e o sadismo do nosso ''Coffin Joe'' tacando o terror e trollando toda a população de uma cidadezinha. (Aliás, cidades pequenas em histórias de terror são sempre muito bem-vindas.)

E é sempre bom afirmar o quanto Mojica - um impressionante autodidata - mandou muiiito melhor no horror do que o contemporâneo Herschell Gordon Lewis; um sujeito um tanto arrogante, que pensava ser o primeiro cidadão na face do Planeta Terra a fazer cinema gore. HGL certamente não conhecia - ou simplesmente ignorava - o japonês Inferno / Jigoku, feito anos antes do bastante questionável Banquete de Sangue; que, inclusive, pelo que lembro, mostrava o gore somente APÓS os assassinatos, e não durante a matança. (Já Meia Noite mostra o gore rolando solto no ato mesmo.)

Já as duas sequências de Meia Noite foram exibidas dentro do cinema.

Assistindo Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver pela primeira vez em um bom tempo, pude reparar três coisas não tão agradáveis assim:

1) O filme é longo demais.

2) O filme me pareceu um tanto repetitivo, algo que as partes I e III não são - ao menos não para mim.

3) A dublagem do Zé me pareceu bem fora de sincronia às vezes, algo que não reparei no filme anterior.

De qualquer forma, Esta Noite é um espetáculo forte, com sequências como a do inferno em cores, e um personagem - o agressor sem face e todo de preto - que pode ter influenciado a primeira temporada de American Horror Story. (Brazilian Horror Story!)

Já Encarnação do Demônio pode ter mais a cara do roteirista Dennison Ramalho do que do próprio Mojica. Tem aquelas fortes características anti-autoridade e ''favela-movie'' que o Ramalho mostraria no curta Ninjas, e, em menor escala, no longa Morto Não Fala.

Com uma abordagem que separa as cenas de maneira meio HQ, Encarnação conta com um ótimo elenco, onde destaco três musas do cinema brasileiro: Cristina Aché, Débora Muniz e Helena Ignez.

Como os efeitos gore são a cargo do ''Tom Savini brasileiro'', Kapel Furman, Encarnação alcança uma forte dose de realismo visceral e náusea.

Mas aí preciso citar um forte ponto negativo de Encarnação: as altas doses de flashbacks dos dois primeiros filmes, além de situações que recorrem à dobradinha Meia Noite / Esta Noite. Dá uma impressão que, ao finalizar a Trilogia Zé do Caixão quatro décadas depois, o filme passa muito tempo preso no passado. Parece que essa faceta ''fanboy'' - da dupla Dennison Ramalho / Paulo Sacramento - falou alto demais em alguns momentos.

Ainda assim, é um espetáculo forte e de qualidade, sem dúvidas. Com certeza infinitamente superior ao terceiro filme das bruxas feito por Dario Argento...

Já uma coisa que achei um pouquinho frustrante, no evento em si, foi o minúsculo intervalo entre uma sessão e outra. Os filmes foram exibidos com uma pequena pausa de apenas 10-15 minutos de uma sessão para a outra, quando o ideal seria ter meia-hora em cada um dos intervalos. Assim sendo, a primeira sessão aconteceu às 23H05, e a terceira acabou pouco antes das 04H30.

De resto, preferi passar fome do que gastar 6 mangos no brownie da Cinemateca - ou 8 bastardos em algum salgadinho que estava do seu lado. Afinal de contas, meus recursos são limitados, e recuso ser assaltado por livre e espontânea vontade.

Mas, é claro, no fim das contas a Cinemateca merece sim os parabéns de qualquer forma. Afinal, fazer um evento desses com entrada gratuita, e com dois dos filmes em película, é uma vitória e tanto. Aliás, a mostra segue até Domingo, também exibindo O Despertar das Bestas / O Ritual dos Sádicos, igualmente em 35MM.

Cotações de 0 a 5:

À Meia Noite Levarei Sua Alma: 4.5

Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver: 3.5

Encarnação do Demônio: 3.5

Notas: A primeira sessão estava bem cheia, acho até que lotada. A segunda também estava bem cheia, porém com menos gente. E a terceira já estava com bem menos gente, e muitos assentos livres.

PS: Ontem, Sexta-Feira, 13 de Março, além de ser o dia em que José Mojica Marins faria 84 anos, também foi o vigésimo quarto aniversário da morte de Lucio Fulci - que, curiosamente, parece ter tido umas influências de Mojica em alguns dos seus últimos filmes, como Enigma do Pesadelo e Gato no Cérebro. Será que Fulci gostava de Mojica? Enfim, o grande Fulci certamente merece a reputação de ''The Godfather of Gore'' muito mais do que o já citado HG Lewis.

PS Bônus: Bem que uma mostra ou mini-retrospectiva do Sady Baby seria uma ótima ideia, não? Sady e Mojica são, para mim, as duas grandes lendas do cinema brasileiro - e, agora, só o Sady permanece entre nós.

MATERIAL BÔNUS: Uma Infelicidade Bem Mais Infernal do Que os Filmes do Zé do Caixão

Acabei dando um jeito de comer alguma coisa após sair da Cinemateca. Aí peguei o metrô e, ao chegar na estação Sé por volta de 6 da manhã, adivinha o que aconteceu?

O metrô parou meio que na metade, e não abriu as portas, e uma galerinha lá ficou agindo meio desesperada.

A princípio achei se tratar de mais um suicídio no metrô.

Mas daí descobri que um cara lá (há rumores de que podia estar bêbado - não se sabe) acidentalmente colocou a cabeça além da faixa amarela, e acabou sendo brutalmente atingido pelo metrô. Tudo indica que ele morreu mesmo. Não sei todos os detalhes porque recusei ficar por perto me inteirando sobre o ocorrido, mas pude ver os policiais do metrô colocando o corpo dele num saco preto. Havia também uma poça de sangue muito horrorosa ao lado do corpo. Uma situação simplesmente deplorável e triste.


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